
Quando meu avô paterno, Manoel Agostinho da Silva, cruzou o Atlântico, no início do século XX, trazia na bagagem pouco mais que a coragem de um jovem de 15 anos e um diploma primário. Chegou a São Manuel, uma terra que florescia sob a sombra do ouro verde, o café. A cidade, naquela época, pulsava com promessas de prosperidade, e foi nela que Manoel plantou suas raízes, ainda que o início fosse feito de sacrifício e braços calejados. 3a5k68
Na Estação Ferroviária, ele carregava sacas de café e mercadorias. Mas os olhos daquele português audacioso, tão atentos quanto o coração, logo perceberam algo mais: uma grande oportunidade. O querosene, tão essencial à vida cotidiana, era adquirido em grandes volumes, iníveis para a maioria. Foi assim que Manoel, forjado em suas duras economias, começou a reembalar o combustível em galões menores, percorrendo a cidade com o produto que iluminava as noites e aquecia as as da pujante São Manuel.
Com o tempo, sua carroça, puxada por burros, avançava não apenas pelas ruas, mas também pelas fazendas. O pequeno comerciante se tornava um visionário. E, o a o com sua dedicada esposa, Anna Cândida, construiu não apenas um negócio, mas uma família que refletia o mesmo espírito de união e força. Seus dez filhos, cada um com suas histórias, fizeram do sobrenome Silva sinônimo de resiliência e dedicação, nas pragas são-manuelenses.
Mas ele nunca se contentou apenas com o sucesso material. No esporte, encontrou outra paixão. Presidiu a Associação Atlética São-Manuelense, por várias vezes, e teve o orgulho de ver seus filhos envergarem a camisa rubro negra, onde seis deles jogaram juntos no time principal. A influência da família no esporte local ia além do futebol: atletismo, vôlei e basquete também eram modalidades em que seus filhos brilhavam, levando o nome da cidade a competições regionais e estaduais. Manoel via nos esportes uma extensão de sua visão de vida – disciplina, trabalho em equipe e a constante busca por superação – e fazia questão de incentivar a prática esportiva como parte da formação de caráter.
A prosperidade de Manoel se expandiu ainda mais quando, se tornou também dono de fazenda e fundou, ao lado dos filhos, o Armazém de Secos e Molhados dos Irmãos Silva, um ponto de comércio essencial na cidade, que atendia tanto a população local quanto as demais fazendas ao redor. Não satisfeitos, os Silva compraram da família Targa uma fábrica de bebidas, um o audacioso que consolidou sua presença no mercado regional. Com isso, diversificaram seus negócios e fortaleceram ainda mais o nome da família, gerando empregos e contribuindo com o desenvolvimento econômico de São Manuel. Dos 10 filhos (Tonico, Sofia, Alfredo, José, Arlindo, Ercília, Hélio, Armando, Alcides e Waldemar) a maioria permaneceu em São Manuel nos negócios da família, tendo dois deles abraçado carreiras ímpares na área bancária e na educação.
O fato é que a rápida prosperidade de Manoel Agostinho chamou a atenção dos executivos da Shell, (na época chamada Anglo-Mexican) que impressionados com suas vendas de querosene, fez dele representante oficial na cidade. Foi assim que nasceu o famoso “Posto do Silva,” um marco que, mais do que um ponto comercial, se tornou um símbolo da força de um imigrante que transformou dificuldades em oportunidades.
A prosperidade precoce lhe permitiu ampliar o posto de gasolina com um enorme galpão para abrigar os carros e caminhões e construir ao mesmo tempo o enorme sobrado, o ‘Solar dos Silva’, que lançou as suas raízes e deixou a marca definitiva da sua habilidade comercial.
O que mais me toca, porém, é lembrar dos Natais na casa do meu avô. Antes de se sentar à mesa (longos 30 metros dentro do Galpão) rodeado pela imensa família entre filhos, noras, netos e sobrinhos, ele fazia questão de proporcionar primeiro, a quem quer que asse na frente do posto, uma enorme mesa, repleta de frios, bebidas e aperitivos. Era sua forma de dizer “muito obrigado” todos os anos à cidade que lhe deu tanto.
A história de Manoel Agostinho da Silva não é apenas a história de um português que veio tentar a vida no Brasil. É a história de São Manuel, de sua gente trabalhadora e solidária, de uma cidade que acolhe e permite sonhos florescerem. E enquanto os ecos de suas conquistas continuam a ressoar, ele permanece vivo em cada lembrança, em cada pedaço de chão que ajudou a construir, seja no comércio seja nos esportes.
A história de Manoel Agostinho da Silva transcende a jornada de um jovem que ousou desafiar o oceano em busca de um novo mundo. É a alma de São Manuel que pulsa em cada o seu, nas mãos calejadas que moldaram o futuro e nos sorrisos que semeou por onde ou.
Sua saga mistura-se à essência de uma terra generosa, que acolhe, abraça e transforma sonhos em realidade. Os ecos de suas conquistas não se limitam ao ado – vibram no ar, repousam no comércio que prospera, no esporte que une, e em cada recanto onde sua história, permanece viva como um legado inesquecível aos são-manuelenses do ado e do presente.
José Luiz Ricchetti – 20/11/24